À procura da comunidade perfeita. CP#60
Ser uma parte valiosa de um cenário não é necessariamente sobre o quão inteligente ou talentoso você é, mas sobre o que você tem a contribuir
Nesta edição:
I. Comunidade é a palavra da moda.
II. A ideia de uma “scenius”.
III. Mudança de plataforma?
IV. Conecta links.
V. Conecta livros.
Bom dia, boa tarde e boa noite. Quase não enviei essa edição hoje por motivos de "não consegui desenvolver o tema da maneira que gostaria" (é raro mas acontece com frequência). Porém, como prometi pra mim mesmo que esse ano faria de tudo para manter a consistência e a frequência (quinzenal) prometida, não poderia falhar logo na primeira oportunidade. "Problemas técnicos" também atrapalharam mas no apagar das luzes, a edição saiu.
I. Comunidade é a palavra da moda.
A palavra comunidade é, talvez, a mais importante quando se pensa em produção de conteúdo. E como parece que acontece com tudo que é importante nesse meio, de tanto se falar disso, a palavra saturou, virou quase um clichê. Já ouvi até o termo "fadiga de comunidade" por aí.
Todo produto digital — curso, newsletter, podcast — está gritando aos quatro cantos da internet sobre ter comunidade. Sobre a importância de criar comunidade. Eu realmente acredito na primeira frase do parágrafo acima. O conceito de comunidade é dos mais fundamentais e é um dos meus grandes objetivos aqui.
Mas também acredito que a primeira regra do Clube da Luta se aplica nesse caso. Se você já assistiu ao filme sabe que a primeira regra do Clube da Luta é: você não fala sobre o Clube da Luta. E a primeira regra de quem quer criar uma comunidade poderia ser: você não fala que quer criar uma comunidade.
Ou, pelo menos, você não precisa ficar o tempo todo falando sobre a necessidade de criar comunidade ou o quanto sua comunidade é legal. (que é justamente o que vou fazer agora).
A principal riqueza da Conectando Pontos é a quantidade de pessoas incríveis que reunimos aqui. Já chamei essa reunião de pessoas de "comunidade" mais de uma vez. Mas comunidade é muito mais do que o que temos aqui.
Falar de comunidade sem mencionar a compreensão de que é preciso tempo e recursos para que ela seja de fato construída e nutrida, só não é pior que minha frustração por não ver uma maior interação entre vocês leitores. (e a culpa não é de vocês mas da lógica de conversa de uma newsletter).
Como mencionei (quebrando a primeira regra), um dos meus maiores objetivos é fazer com que todas as pessoas aqui reunidas se tornem uma verdadeira comunidade online de confiança. Quando pensei na “Central de Newsletters”, a ideia foi a mesma. Plantar uma semente para uma comunidade para troca entre leitores e criadores.
Enxergo de verdade um enorme potencial de comunidade se todos aqui, entre outras coisas, estivessem interagindo mais. Ou um enorme potencial de "scenius", conceito que descobri recentemente.
II. A ideia de uma “scenius”.
No mundo antigo, a palavra “gênio” se referia tanto a pessoas quanto a comunidades.
Brian Eno, músico e filósofo de meio período, cunhou um termo para descrever essa ideia: Scenius (que rima com "genius").
"Scenius" (me falta criatividade para uma tradução legal) descreve a inteligência e a intuição de uma cena cultural. É como se o gênio fosse uma busca coletiva tanto quanto individual. Nas palavras de Eno: “Se o gênio é a inteligência criativa de um indivíduo, scenius é a inteligência criativa de um grupo”.
O Austin Kleon também escreveu sobre o termo do Brian Eno em "Mostre seu Trabalho": "Existe uma maneira mais saudável de pensar sobre a criatividade, que o músico Brian Eno chama de 'scenius'. Sob esse modelo, grandes ideias geralmente são geradas por um grupo de indivíduos criativos - artistas, curadores, pensadores, teóricos e outros formadores de opinião - que compõem uma 'ecologia de talentos'."
Se olharmos atentamente para a história, muitas das pessoas que consideramos gênios solitários eram na verdade parte de toda uma cena de pessoas que apoiavam umas às outras, olhando para o trabalho umas das outras, copiando umas das outras, roubando ideias e contribuindo com ideias.
A ideia de "scenius" não retira as conquistas dos grandes indivíduos: apenas reconhece que um bom trabalho não é criado no vácuo e que a criatividade é sempre, em certo sentido, uma colaboração, o resultado de uma mente conectada a outras mentes.
O que eu adoro nessa ideia é que ela abre espaço na história da criatividade para pessoas como eu e, talvez, você: pessoas que não se consideram gênios. Ser uma parte valiosa de um cenário não é necessariamente sobre o quão inteligente ou talentoso você é, mas sobre o que você tem a contribuir - as ideias que você compartilha, a qualidade das conexões que você faz e as conversas que você inicia.
Sobre essa ideia, o Austin Kleon coloca de forma ainda mais simples: "Genius" é um egossistema, "scenius" é um ecossistema.
"Nosso mundo é um ecossistema no qual nossa única chance real de sobrevivência como espécie é a cooperação, a comunidade e o cuidado, mas é liderado por pessoas que acreditam em um egossistema, movido pela competição, poder e interesse próprio."
Se nos esquecermos da genialidade e desse egossistema e pensarmos mais em como podemos alimentar e contribuir para um cenário, podemos ajustar nossas próprias expectativas e as expectativas dos mundos que queremos que nos aceitem. Podemos parar de perguntar o que os outros podem fazer por nós e começar a perguntar o que podemos fazer pelos outros.
Scenius. Ecossistema > Egossistema.
Esse é o potencial e a ideia de comunidade que quero perseguir e construir aqui.
III. Mudança de Plataforma?
Por algumas mensagens que recebo, percebo que a ideia de interagir com outros membros ou incluir outras pessoas nas conversas que temos quando trocamos e-mails pode ser um desejo não só meu como de muitos aqui.
Ainda não sei se esse desejo é uma real necessidade, mas uma mudança simples que poderia ter algum impacto nesse sentido, seria uma troca de plataforma. Na Substack, cada edição que você recebe por e-mail vira também um post, onde além de compartilhar e deixar um like, é possível comentar. Assim, as edições favoritas ganhariam destaque e o mais importante, todo mundo poderia trocar não só comigo mas uns com os outros.
Já recebi mensagens de pessoas pedindo essa função específica e essa seria a principal razão no momento por escolher mudar de plataforma.
Essa edição já seria a primeira enviada via Substack se não fosse por problemas técnicos ao importar minhas campanhas antigas no Mailchimp pra lá. Nesse meio tempo acabei pesquisando e lendo muita coisa sobre a plataforma e perdi um pouco a convicção sobre mudar agora. Até porque tem outras plataformas aparecendo que parecem ser muito boas.
E por que estou contando isso? Além de usar como desculpa por não conseguir enviar a edição no capricho que gostaria, queria saber o que você acha disso tudo?
Estou falando besteira quando falo sobre esse potencial que temos aqui? E uma mudança de plataforma por essa nova funcionalidade?
Como sempre, sou péssimo em trazer e achar respostas, mas o barato disso aqui é que vocês me deixam divagar sem apelar para o lumenismo (me segurei o tempo todo pra não fazer referência ao BBB mas perdi na última linha, foi mal). E obrigado e tamo junto! 😃
🔗 Conecta Links
◾ Não consegui desenvolver o tema como gostaria mas o texto "Comunidade: Uma necessidade humana atemporal", do Alex Bretas, faz o trabalho por mim. "(...) vivemos uma crise de comunidade. A busca pela liberdade e pelo sucesso individual a todo custo afeta a vivência comunitária, e essa narrativa liberal é predominante hoje. Precisamos reaprender a cultivar comunidade em um contexto fluido e digital. Ao mesmo tempo que muitos de nós nos sentimos solitários e incompreendidos, o mundo digital amplia de maneira inédita nossa conectividade. Temos acesso a uma infinidade de pessoas, conteúdos e recursos, assistimos às histórias uns dos outros nas mídias sociais, mas sentimos falta de empatia. Sentimos falta daquela sensação de estarmos em um mesmo barco rumo a algum lugar promissor. Nesse cenário paradoxal, como repensar a ideia de comunidade?"
◾ Em um dos meus blogs favoritos, "O alto custo da falta de confiança", fala sobre a polarização e o distanciamento social do momento que nos afastaram de qualquer senso de comunidade em um grau que pode parecer insolúvel e o quão caro isso pode nos custar. "Quando não podemos confiar um no outro, nada funciona. À medida que participamos cada vez menos de nossas comunidades, achamos mais difícil sentir que outras pessoas são confiáveis. Mas se pudermos trazer de volta um senso de confiança nas pessoas ao nosso redor, as recompensas serão incríveis."
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◾ E o tal do Clubhouse? Só se fala disso. Ainda não consigo me imaginar curtindo uma rede social de áudio. Mas confesso que o FOMO e a curiosidade as vezes bate. Enquanto não chega convite, a YOUPIX perguntou a profissionais do mercado o que eles acham que tem por trás do app e quais as oportunidades pra quem trabalha com conteúdo digital: Clubhouse: o que é e qual o potencial para o mercado de conteúdo?
- E mais rápido do que se imaginava, já saiu notícia de que o Facebook estaria criando seu "Facebook-House" (assim como o Twitter), o que rendeu bons memes.
◾ Continuando o assunto puxado na curadoria passada sobre newsletters, a Fast Company fala também sobre a chegada do Twitter e do Facebook a esse universo. "As newsletters fornecem ao jornalismo um modelo de negócios que não depende de uma grande plataforma de tecnologia - e aos leitores uma maneira mais tranquila e sustentável de se envolver com as notícias. Mas agora as plataformas Big Tech estão se intrometendo." "Eles constroem a própria versão de uma ideia promissora, tentam acabar com a concorrência pelo caminho e aí começam, ativamente ou por negligência, a arruinar aquela ideia que eles estavam copiando lá atrás”. Twitter e Facebook vão estragar as newsletters, não vão?
◾ Duas letras no final de um endereço da web podem ser o futuro econômico da ilha de Tuvalu. É o que mostra o texto "Why domain names are the new natural resource." Desde 1995 a ilha é dona do .tv que acompanha uma url. O detalhe é que o sufixo .tv está gerando uma receita enorme. Só com o Twitch.tv, por exemplo, foi gerado mais de US$ 1,54 bi apenas em 2019. História interessante.
◾ Existe um segredo para fazer sucesso no Instagram? "Depende do que você entende por 'segredo' e por 'sucesso." Um artigo do NYT inspirado nesse post que viralizou: Why your Instagram Engagement Kinda Sucks Right Now.
◾ The Pudding é uma publicação digital que explica as ideias debatidas na cultura com ensaios visuais. É uma espécie de Super Interessante cultural com representações visuais muito bem feitas. Tem muita coisa legal mas eu curti bastante o gráfico que ranqueia rappers de acordo com o tamanho do seu vocabulário que tá aqui: "Rappers, classificados pelo número de palavras exclusivas usadas em suas letras".
◾ O carnaval chegou sem carnaval. Folia e Covid-19 não combinam, e o bloco da vacina está longe de ter o número de integrantes para ganhar as ruas. Esta agenda de eventos online pode ajudar a levar um pouco do clima carnavalesco pra dentro de casa. E vamos nos cuidar para que a folia volte no próximo ano.
📚 Conecta Livros
◾ Isso é marketing: Para ser é preciso aprender a enxergar, de Seth Godin.
Editora Alta Books. 288 páginas.
Seth Godin é uma das principais referências em marketing hoje. “Isso é Marketing” descreve exatamente o tipo de marketing que deveríamos acreditar e praticar. Não aquele focado apenas em crescimento e conversão mas principalmente em gerar mudanças, construir relacionamentos e a imagem da marca no longo prazo. Seth ataca a falta de humanização e empatia com o consumidor que tem se tornado o marketing e dá uma grande aula de marketing e comunicação. E pra mim que não sou profissional da área, arrisco dizer que vale mais que muito curso e palestra por aí. Foi o que a leitura aqui se tornou, um verdadeiro curso, com muita dica valiosa, útil e aplicável.
◾ Nascido do Crime, de Trevor Noah.
Editora Verus. 320 páginas.
Indiquei a versão em inglês desse na edição #44 mas agora a saga de Trevor Noah, que viveu a infância e início de vida adulta no período final do apartheid como um "colored" (filho de branco com preto), o que era considerado CRIME na época, também está em português. É um livro impossível de largar, em que o Trevor (hoje famoso comediante e apresentador nos EUA) relata como foi crescer imerso numa cultura de pobreza, insegurança e criminalidade ao mesmo tempo em que enfrentava o dilema de não ser preto o suficiente pra ser considerado preto, nem branco o suficiente pra ser considerado branco. Emocionante, engraçada, brutal e educativa aula de vida.
E essa saiu em tempo record. To ficando bom nisso. Se é que essa edição ficou boa e sem muitos erros. Aproveita pra me dizer o que achou e trocar aquela ideia respondendo esse e-mail.
Seguimos conectados e até a próxima.
~ Edgar Oliveira
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