Nesta edição:
I. Não existe um único tempo.
II. Conecta Links.
III. Conecta Livros.
I. Não existe um único tempo
Tudo o que consegui fazer nas últimas semanas foi o oposto do que disse na última edição. E a desculpa dessa vez não é nem a falta de tempo, apenas. É nada mais que uma dissolução de sociedade de forma não amigável. 2020 segue imbatível.
O lance é que nas últimas semanas fiquei com zero vontade, capacidade de concentração e criatividade (fora os acessos de raiva, ansiedade e incansáveis trocas com advogados) pra sentar aqui e escrever qualquer coisa que fosse. Agradeço as mensagens de quem sentiu falta e "cobrou" o envio nas últimas semanas. Poucas vezes fiquei feliz com uma cobrança. Hoje a ideia é ter uma daquelas edições compactas ( e se você chegou aqui há pouco tempo, essas edições são focadas apenas na curadoria de links, atualizações e indicações), pra ir voltando ao ritmo.
"Não existe um único tempo. Existe uma infinidade deles."
Não foi nada de caso pensado (pelo menos não de início) mas o tema “tempo” é recorrente na curadoria dessa edição. Tudo começou com um livro do bom doutor, se agravou com a série mais falada dos últimos tempos e algumas conversas sobre, chegou até um despretensioso filme de comédia, passou por alguns links que foram chegando, até que no fim das contas já estava, aí sim, deliberadamente procurando e relembrando livros e filmes sobre o assunto.
Acabei chegando em “A Ordem do Tempo”, livro do Carlo Rovelli, autor de "Sete breves lições da física", dos melhores livros que li em 2018 . A natureza do tempo talvez seja o maior mistério de todos. E Rovelli, com sua já conhecida prosa lírica e didática nos convida a considerar diversas questões que envolvem esse enigma que continua a confundir físicos e filósofos, quem dirá meros curiosos.
Nesse 2020, ano da pandemia, a curiosidade sobre a passagem do tempo, um tema que sempre foi atraente, parece aumentar. Num ano em que todo mundo (ou quase todo mundo) está há meses preso dentro de casa, o assunto ganha ainda mais motivo para ser discutido. Alguns dias nos dão a sensação de serem mais lentos, enquanto algumas semanas parecem voar. Sem falar naquela sensação de que todo dia parece o mesmo dia.
Mas enfim, não era pra ter me empolgado. Não é ideia dessa edição entrar nessas “viagens”. Ainda. Antes irei terminar o livro e acabar essa série que dá uma fritada no cérebro. Agora deixa eu encher a cuca de vocês com links pra gente quebrar a cabeça juntos depois. :)
🔗Conecta Links
◾ Além do livro do Rovelli, comecei a ler "Musashi". Finalmente. Tenho vontade de ler esse livro há bastante tempo. Mas não é toda hora que você tá com disposição pra encarar um calhamaço de 900 páginas (só o volume I) e acabava sempre deixando pra depois. Se trata de um romance épico sobre a trajetória do maior samurai da história do Japão. E pelo começo da leitura acho que não vou demorar muito tempo agarrado nele não.
◾ ◾ Enquanto vejo muita gente que não tem conseguido ler nada, a literatura talvez é o que esteja me salvando de um colapso nervoso. Não sei como tá por aí mas dependendo, pode ser um desafio legal. Pegar aquele livro (todo mundo tem ao menos um desses) intimidador, seja pelo tamanho ou pela densidade do assunto, e ler de uma vez por todas. Ou uma releitura muito adiada quem sabe. De qualquer forma, sempre gosto de ouvir o que as pessoas tão lendo. É assim que descubro muita coisa boa.
◾ Tentei fazer um suspense mas não acredito que tenha funcionado. A série em questão é Dark, a sensação alemã da Netflix que só to assistindo agora. Já havia assistido alguns episódios da primeira temporada lá em 2017 mas não fui fisgado. Dessa vez esperei passar o frisson, fugi dos spoilers e recomecei tudo desde o início.
Acabo de acabar a segunda temporada. Enquanto a primeira constrói suas intenções sem pressa (chegando até a irritar as vezes), a segunda - por já ter as bases estabelecidas - avança em diversas ramificações que deixam a trama ainda mais complexa e interessante. E a primeira temporada passa até a ficar melhor depois da segunda.
◾ ◾ Já tem muita coisa por essas internets esmiuçando a série. Só vou dizer que diferente do que pensei na primeira tentativa, é muito muito mais que apenas uma ficção sobre adolescentes desaparecidos e viagens no tempo. Ainda falta a última mas recomendo muito. Não desistam na primeira temporada.
◾ Criar playlists e compartilhar com os amigos se tornou um passatempo divertido por aqui e a Do Not Disturb foi bem aceita pela crítica (claque).
◾ ◾ E já que estamos no assunto tempo, deixo aqui uma música que tenho até ciúme de compartilhar (vocês também tem isso?). Time do Hans Zimmer (trilha sonora de Inception) seria a música que eu escolheria como pano de fundo da vida.
◾ Saiu há pouco o que vem sendo considerado o melhor filme para esse período de isolamento social. Palm Springs é uma comédia romântica divertida, recheada de humor esperto e que parte de uma premissa que não é das mais novas. É desenvolvida em cima de situações absurdas mas que, talvez, não sejam tão absurdas assim. Assistir sem nem saber do que se trata deve ser ainda divertido. Mas se quiser conhecer o big plot de uma vez, clica ali pra assistir o trailer (porque os trailers hoje em dia entregam quase o filme inteiro?) ou veja porque esse crítico afirma que esta é a melhor comédia pro momento: "é sobre se sentir infinitamente preso e encontrar a felicidade mesmo assim." E "sobre como a realidade pode parecer interminável."
◾ Passar horas vendo vídeos no youtube nunca foi a minha. Mas se teve um canal que acompanhei de perto durante um bom tempo foi o Kurzgesagt - In a Nutshell. É um projeto sediado em Munique, criado em 2013 e focado na produção de vídeos educacionais em animação, respondendo a questões importantes do nosso tempo.
◾ ◾ Entre os muitos vídeos que valem o destaque, o "A New History for Humanity" sugere adicionarmos 10.000 anos ao nosso calendário atual, mudando o marco zero. Isso mudaria nossa percepção sobre a história e como a sentimos. Já "Time: The History and Future of Everything", nos mostra porque o tempo faz sentido em pedaços pequenos. Mas quando você olha para grandes extensões dele, é quase impossível entender a situação. Pequenas aulas de história que mostram como nossa percepção do tempo pode mudar como enxergamos a nossa própria história como espécie. Ps: dá pra acionar as legendas em português.
◾ "Quanto tempo o tempo tem" é um documentário disponível na Netflix. Trata do mistério do tempo por um ponto de vista mais acadêmico. Entrevistas com filósofos, historiadores e sociólogos que discorrem sobre a definição de tempo, as possibilidades de medi-lo, sua transformação social e econômica, sua influência na tecnologia e na própria definição de ser humano.
◾ Episódios dos meus dois podcasts favoritos que tornam o "lavar louças" agradável e até desejável. "Tribos" do Boa Noite Internet e "Mark Zuckerberg está no lado errado da história" do Tecnocracia, tratam cada um a sua maneira e entre outras coisas, do progresso tecnológico e o poder do tempo.
◾ Já está na hora de conhecer o Marcelo Marques. Em seu canal do YouTube, Audino, como é conhecido na internet, usa um vocabulário popular para transmitir para a molecada as ideias de grandes filósofos. "Se você entender o pensamento de uns caras como Nietzsche, Platão e Spinoza você vai ter uma visão para lidar melhor com seus problemas. E o que não falta na favela é a molecada tendo problema pra resolver, só os corre de mil grau. Se você passa uma visão de uma forma que eles entendem, com a linguagem que eles gostam, você transforma vidas e abre mentes. A molecada precisa ter uma filosofia própria".
◾ O perfil @funkeiroscults no instagram (que não sei se é do próprio Audino ou inspirado nele) já é mais voltado pro humor mas segue a mesma pegada. "Tanto a história como a sociologia está chegando na quebrada por causa do RAP, na minha visão. Desde racionais MCs trás muito do contexto histórico e de sociologia. Só que a filosofia não, a filosofia ficou um bagulho bem elitista né? Nunca conversou com a periferia, com o povão". - Audino. Pega a visão.
◾ Pessoas e histórias que importam. É como a MargeM Newsletter se descreve. É na na verdade uma brilhante curadoria e depósito de referências sobre os mais diversos assuntos feita pelo Thiago Ney. Trago muita coisa pra cá que conheço através dela e a MargeM merece os devidos créditos.
◾ De diversas partes do mundo, cinco fotógrafos de rua para seguir no Instagram.
◾ Não tem como ficar alheio a toda repercussão que o TikTok tem causado. Sigo resistindo mas sinto que em algum momento vou me convencer de que vale a pena explorar a rede social dos jovens. Aidan Caroll é mais um adolescente que viralizou por lá ao transformar em montanha russa os gráficos de casos de coronavírus de diversos países. 4 milhões de visualizações em dois dias.
◾ Abra uma janela em algum lugar do mundo. Curti muito isso.
◾ Por que o tempo parece tão estranho em 2020. A Reuters soltou esse material bem legal que, além do texto, se apoia em gráficos e testes de percepção para ilustrar alguns fatores que podem distorcer nosso senso de tempo. "A pandemia global de coronavírus aumentou a nossa consciência de que o tempo é subjetivo".
◾ "A aposta na imunidade de rebanho contra a covid-19 no Brasil coloca em risco milhões de vidas". Não há consenso sobre a taxa de infecção da população para alcançar a imunidade coletiva; a estratégia é tida como "roleta russa" apontada contra vulneráveis.
◾ A real diferença entre "creators" e "influencers" não é uma questão de gênero. Mas o histórico e a hierarquia da internet. "A atual distinção entre criadores e influenciadores tem muito mais a ver com qual plataforma uma pessoa ganha sua notoriedade do que com seu gênero".
◾ O walkman, 40 anos depois. Na The New Yorker, um perfil do aparelho que ensinou ao mundo o que é se distanciar socialmente. "Depois do Walkman, a música poderia ser um silêncio para todos, menos para o ouvinte, envolto em uma paisagem sonora pessoal que se desenrolava em fita cassete analógica. O efeito foi chocante até para os seus criadores."
📚Conecta Livros
O fim da eternidade, de Isaac Asimov.
Editora Aleph. 256 páginas.
O Fim da Eternidade do "Bom Doutor" da ficção científica Isaac Asimov é um romance de mistério que explora viagens no tempo e realidades paralelas para propor diversas reflexões sobre o nosso comportamento e a nossa evolução. Como romance é apenas legal. Os personagens ficam devendo em profundidade e é difícil simpatizar com o protagonista Andrew Harlan, nascido no século 95 e escolhido para ser um Técnico que viaja no tempo, observando e alterando o destino de milhões de pessoas. Já o mundo elaborado por Asimov é muitíssimo bem construído e a narrativa envolvente e cheia de reviravoltas. Não me surpreenderia descobrir que Dark se inspirou em muita coisa dessa obra. Sensacional.
A história da sua vida e outros contos, de Ted Chiang.
Editora Intrínseca. 368 páginas.
Esse é um livro com oito contos de ficção científica do premiado Ted Chiang. O destaque das estórias não está na ação frenética em meio a tecnologias avançadas, elementos futuristas e alienígenas, mas em ideias filosóficas, teológicas, matemáticas, psicologicamente densas e criativas. O conto "História da sua vida" é o mais famoso. Dá nome ao livro e foi para as telas como o filme "A Chegada". Mas todos são incríveis. Tenho meus preferidos mas destaco hoje "O Inferno é a ausência de Deus", onde o céu e o inferno coexistem, e a passagem dos anjos pela Terra provoca cataclismos e mortes trágicas. Os personagens tentam interpretar esses fenômenos miraculosos como encadeamentos de causa e efeito, sem sucesso. Imperdível para todo fã do gênero.
Ficamos por aqui. Que o momento turbulento passe logo para que possa aparecer na sua caixa de entrada com mais frequência. Espero que esteja tudo bem na medida do possível por aí. E como já sabe, se quiser trocar uns e-mails, cá estamos.
Até a próxima.
~ Edgar
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